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Remédios para uma doença crónica

 

Voltar à nossa Ilha, mesmo que por uns diazinhos, traz-nos uma felicidade imensa.

Perante a beleza da paisagem e a amabilidade das pessoas, parece que nos tornamos mais sensíveis, pois, nos meios grandes, as relações humanas não se cultivam, nem se proporcionam.

Sobre o cais da Horta, dezenas e dezenas de passageiros. Muitos como eu, tinham viajado, entre Lisboa e a ilha da Horta, como proclamou um funcionário do check-in, alto e bom som, penalizados pelo acréscimo dos custos dos transportes que os nossos governantes teimam em não querer ver. Outros, alguns deles doentes, regressavam a casa, após exames no Hospital da Horta.

À hora de embarque, chovia que Deus a dava. Uma ambulância trouxe um doente amacado que, sem qualquer protecção ou resguardo, foi transportado para dentro do barco.
Entre o Faial e o Pico, o mar estava revolto e a Montanha escondida entre nuvens negras e espessas.

Há dias, foi anunciado o lançamento do concurso público para a construção do novo Centro de Saúde da Madalena. É um empreendimento grandioso que será dotado de moderno equipamento e, além dos atuais serviços e reduzidas valências, contará com uma maternidade e  especialistas em obstetrícia e pediatria.

Pensava nisto, com o barco rebolando nas vagas de norte, quando me ocorreu a construção, há mais de uma década, do novo centro de saúde de São Roque.

Então, foi prometido que os picoenses teriam melhores serviços de saúde. Falou-se até na possibilidade de ali se realizarem pequenas cirurgias e, porque não? Partos. O edifício foi inaugurado, com novos meios de diagnóstico. Foram até adquiridos equipamentos informáticos para a telemedicina, mas esses não saíram dos caixotes e ficaram inutilizados.

Deu-se um salto em frente na prestação de cuidados de saúde diferenciados? Não! Ficámos na mesma. Ou melhor: ficámos pior porque hoje a ilha do Pico tem menos população e a que resta está mais envelhecida, portanto mais necessitada de cuidados de saúde diferenciados e com menos capacidade para deslocar-se ao Faial. Temos o mesmo número de médicos de clínica geral e continuamos sem especialistas que respondam  às carências dos picoenses em: cardiologia, urologia, neurologia, pelo menos.

Quanto à telemedicina, um recurso fundamental para responder em casos mais graves e superar a inexistência das especialidades atrás referidas e outras, nada foi feito.

Os governantes até podem encará-la como solução, mas os médicos não entram no esquema. Porquê? São impreparados, e as responsabilidades dos centros hospitalares a que os centros de saúde ficarão ligados, serão maiores. Não é verdade? Então implementem já esse processo, pois trará benefícios imediatos a quem vive em ilhas onde não há hospitais...

Estava eu pensando nestes meus protestos, quando o barco entra no porto da Madalena que – dizem - vai ser beneficiado. O mar acalmara e a chuva desaparecera, mas a Montanha continuava escondida. De terra vinha um cheiro diferente, um aroma a faia e a incenso que cobrem cada vez mais a terra fértil desta segunda ilha açoriana, em área, que não em gente e condições de vida.

Em cima do cais, dezenas de pessoas aprestavam-se a viajar para a ilha em frente. Num instante, os passageiros foram saltando para a escaleira, ajudados pela marinhagem. Sempre foi assim e nunca ninguém caiu ao mar, mesmo quando ele está bastante ruim. Será por isso que não se melhora os acessos dos passageiros, nem se instala mangas para os doentes não se alagarem?

Duas ambulâncias aproximam-se do barco, com mais doentes para o Hospital da Horta. A doente que viajou para o Pico, é retirada de bordo e colocado no chão do cais, até que a ambulância fique desocupada. A idosa nada diz, ao contrário dos olhares dos presentes.
          Isto só no terceiro mundo! – comentava alguém.

Só no terceiro mundo, repeti.

O que aconteceu com o centro de saúde de São Roque, pode acontecer com o novo centro de saúde da Madalena, se não se conseguir romper com as limitações que outros impõem.

Entretanto, continuam os doentes a entrar e sair dos barcos,  desabrigados, ao frio e à chuva, apelando à misericórdia divina:  Senhor Bom Jesus, valei-me! Senhor Espírito Santo, valei-me! 

 

       

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